Pequenos privilégios

Publicado por Sebastião Verly 13 de agosto de 2010

Belo Horizonte implantou, neste ano de 2010, a coleta noturna em 30 bairros da gente mais rica da Capital. É um duplo privilégio. Essa medida permitiu manter a coleta seletiva de materiais recicláveis sem tirar nenhum dia da coleta de lixo. Agora quase atendemos aquela senhora do Belvedere que há anos pedia a coleta também aos domingos porque davam festas aos sábados e tinham que guardar o lixo até segunda feira. Agora, pelo menos os restos do churrasco de sábado podem ser colocados no lixo da noite.

Antes de iniciar a coleta noturna, foram contratados 20 estagiários para avisar aos moradores dessa mudança. Grita geral. Uma senhora no Bairro Mangabeiras, ao ser abordada por estar colocando lixo durante o dia, esbravejou dizendo que é um absurdo a Prefeitura impor aos donos dos imóveis um horário para colocar o lixo.  Eu orientei os estagiários para dizer que não era a Prefeitura e, sim, os demais moradores. Ninguém quer ficar com aquelas horrendas sacolas de supermercados ou sacos azuis e pretos o dia inteiro cheio de lixos fedorentos nas ruas próximas de sua casa.

        Logo, a classe alta e até as partes mais altas da classe média pararam de reclamar da coleta noturna. Estão felicíssimos. Noto que as ruas ganharam outra aparência. Ficou mais fácil dirigir os olhares para o belo que caracteriza os nossos bairros mais ricos.

        Essa gente precisa ganhar consciência. Na última sexta feira, formos fazer uma vistoria no final da rua Canárias, área bem mais simples, onde um morador pedia um conjunto de contêineres para recolher os materiais recicláveis. O pessoal ainda acha que coleta seletiva é a salvação da lavoura.

        Ainda estamos analisando se é possível colocar o equipamento porque a depredação é muito grande. São os catadores de materiais, que, agora privados de recolher os materiais dos bairros classe A, vão se esgueirando por todos os lados até em bairros mais humildes, catando seu parco sustento, onde encontrar alguns quilinhos de materiais recicláveis.

        Sou a favor de estender a coleta seletiva porta a porta a todos os bairros. Todos os cidadãos belo horizontinos merecem um tratamento igual. Quanto à quantidade de materiais, isso é bastante relativo. Até porque o grande peso e volume separado nos bairros de classe alta e média, são garrafas de vinho e whisky que estão valendo 2 centavos o quilo triturado.

        Para justificar esse privilégio, essa população beneficiada, poderia, ao menos embalar corretamente o lixo, construir e reformar seus passeios, varrer a frente de suas casas como manda o Regulamento de Limpeza Urbana e até cumprir o código de posturas que manda que o próprio cidadão plante árvores na frente de seus imóvel. E poderia ainda fazer o escoamento das águas internas por baixo do passeio. Essa gente paga um pouquinho mais de impostos prediais e territoriais urbanos pela alta valorização dos seus imóveis. Quanto ao valor pago para recolher os resíduos sólidos é praticamente o mesmo que paga um cidadão de bairros da periferia. No final tudo acabou bem. As empreiteiras estão felizes da vida e os moradores alegres e contentes.

Não creio que alguém se interessará, como eu me interessei em escrever o livro “Limpeza Urbana numa Belo Horizonte Centenária “, no ano de 1997. Mas, se alguém tiver paciência poderá consultar no CEMP, Centro de Memória e Pesquisa da SLU, o relatório da implantação da coleta seletiva com as três etapas, da implantação aos dois monitoramentos, onde verá centenas de relatos e fotos de umas poucas casas dos recalcitrantes e a imensa maioria, cujas fotos panorâmicas mostram como a cidade ficou mais limpa e mais linda, durante todo o dia.

        Parabéns SLU, parabéns equipes da mobilização, do planejamento e da operação. A cidade venceu.

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