Oh que saudades… das frutas do meu quintal! – parte 2
Havia, espalhadas por todos os cantos dos quase seis mil metros quadrados de nosso quintal, plantinhas de quase tudo. Mudinhas recentes e plantas caducando, como um pé de figo que nunca produzia, um marmeleiro que só serviu para tirar algumas varas usadas como instrumento da educação da época.
Voltando para as proximidades da porta da cozinha, havia uma meia dúzia de moitas de bananeiras, um pé de jabuticaba, um abacateiro, que também dava os melhores frutos que já comi. Mais perto de casa, um pé de laranja comum e um pé de mexerica e a horta onde nasciam várias plantas das sementes que ali semeávamos.
Descíamos um pouco e aí ficava a parte mais bonita do quintal: laranjeiras de várias espécies que cultivávamos com a técnica que conhecíamos. Aos poucos, acrescentamos mais duas fileiras de pés de laranja que deixamos dando as primeiras frutas, quando de lá mudamos. Restam as amoreiras que tinham um sabor especial em nossa infância, apesar de que essa árvore fornecia também varas para os corretivos que meu pai aplicava.
O mais curioso é que, quando crianças, ainda freqüentávamos também o quintal da nossa vizinha e amiga Lia do Jiló, onde existiam muitas frutas que não havia em nosso quintal. Lá chupávamos mexericas; laranja cacau, que nunca mais vi em minha vida, lima, lima de bico, que também sumiu completamente.
Até bem pouco tempo, eu matava essa saudade da infância na fazenda do meu saudoso amigo, Luiz Bento, onde, além dessas frutas, há uma grande variedade de mangas, jambo e pitangas de um sabor maravilhoso.
E lá ainda fazia a mistura quase mágica das frutas do pomar com as frutas silvestres que citei em artigo que escrevi sobre as mesmas. Disputávamos com os marimbondos as doces sementes do melão de São Caetano, que proliferavam como trepadeiras de cercas, comíamos aos punhados o milho de grilo e como havia grandes grãos roxeados dessa sementinha doce, as ervas-moura que mamãe dizia ser boa para saúde dos lábios e do estômago e os juás vermelhos que sumiram também com o passar dos anos. Há dias vi nos supermercados uma fruta bem cara, uma espécie de juazinho amarelo, que comíamos no quintal sem maior entusiasmo.
Espero que, mais do que concordar com a doce Adalgiza, também tenha tocado nos sentimentos de saudade dos tempos tão agradáveis da infância daqueles que viveram em circunstâncias parecidas. Parodiando o poeta romântico Casimiro de Abreu, em seu poema “Meus Oito Anos”: “Oh que saudades que eu tenho, da aurora da minha vida!”, eu acrescentaria: e das frutas do meu quintal!
Meus Oito Anos
Casimiro de Abreu (1837-1860)
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
Como são belos os dias
Do despontar da existência!
— Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é — lago sereno,
O céu — um manto azulado,
O mundo — um sonho dourado,
A vida — um hino d’amor!
Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar!
O céu bordado d’estrelas,
A terra de aromas cheia
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!
Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã!
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã!
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberta o peito,
— Pés descalços, braços nus
— Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!
Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!
…………………………..
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
— Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras
Debaixo dos laranjais!
Comentários
Sãoozinha, sinto-me lisonjeado pelo seu comentário. Aproveito o espaço para pedir seu email, pois, há meses, escrevi um artigo que deixei com o Milton do Portal sobre o seu pai, o admirável Piduca.
Queria que você me mandasse dados familiares pois cito os filhos e sua vida na nossa querida Pompéu.
sverly@uol.com.br
Que maravilha! Encontrar os artigos do Tião da Tia Chica emocionou-me muito. Um grande abraço pra você e família.
Sãozinha da Lídia do Piduca.