Causos do Suzenando – III – Pondo o Diabo pra correr
A primeira missa terminou e Suzenando deixou dona Elvira na Igreja e tomou o rumo da Venda do Dôco onde já tinha audiência cevada. Ceva vocês sabem é onde o barranqueiro cria seu pesqueiro deixando comida para os peixes. Albert Einstein dizia que mais importante que o conhecimento era a imaginação, o que não faltava ao nosso herói. E tinha gente que não perdia por nada esses causos.
O assunto era sobre o sermão do Padre Pedro Lacerda Gontijo que falou do perigo do capeta em nossas vidas…
“– Que queres de mim, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Conjuro-te por Deus, que não me atormentes. Jesus lhe dizia: Sai imundo ser, SAI!”
Só esperaram o Suzenando se acomodar na cadeira preferida e veio logo a pergunta. Se ele tinha medo do capeta. Era a bola que ele queria levantada, suspirou e … vamos nessa!
– “dia desses, eu precisava resolver negócio aqui na cidade, apressei a lida na roça, enchi os cochos de milho, joguei um balaio de tamboeiras pras vacas mastigarem e falei com Elvira que ia pra cidade. Ela só falou, vai depressa para chegar com sol.
Arriei a mula, amarrei os alforges e pus uma marchinha viajeira, cabeça cheia de pensamento, tudo que tinha que fazer encaixando.
Eu vou sempre na contramão para ver os carros de longe encostado no barranco alto de mais de metro. Na subida do Salôbro tive que chegar espora, a mula subiu bufando. Passei a Vargem do Galinheiro e peguei a Reta, cerradão fechado dos dois lado. Aí essa mula começou a refugar, até que empacou. Eu chegava a espora e a taca, gritava com a salafrária e ela começou a empinar, se tivesse no mato eu ia achar que era cobra, se fosse de noite eu ia achar que era onça. Mas tava só escurecendo…
Foi quando escutei um pisado nas folhas secas do mato, mas quando eu punha sentido parava. Com muito custo a mula rompeu, mas o barulho continuou, como se fosse um bicho caminhando e foi ficando mais perto. A mula dava umas rabanadas, eu tinha que chegar a espora e a taca pra bicha obedecer.
O sol quase entrando, o barulho do mato cada vez mais arisco. Vi que um “trem” pulou do barranco na garupa e segurou no encosto da sela… Fiz que não vi, continuei tocando, mas reparei nas unha, igual de cabrito. Senti o cheiro de enxofre, meu nariz ardeu, vi que era mesmo o Danado! Se fosse qualquer um tinha borrado de medo, mas eu guentei firme!
Tava no fim da subida, já dava pra ver as casas. Quando é fé o sino da Igreja tocou e o bicho tremeu! Eu pus fé e o sino foi tocando mais alto, mais depressa! Dei uma cutucada nas esporas, e de repente senti o bicho bufar, deu um pulo barranco-acima e entrou no cerrado. Olhei e vi que era ainda rapazinho.
Gritei: “Foge não bobo! Foge não! Passar com cê na porta da igreja! Dá uma prosa mais o Padre Pedro!”