Ao passar na casa de apoio às pessoas do Vale do Aço em Belo Horizonte, tive uma lembrança de meus tempos na cidade de Pompéu, nos anos 1950. Estavam “quentando sol”, como dizíamos naqueles tempos. Sentados do outro lado da rua onde bate sol, conversavam falando quase todos ao mesmo tempo.
Quando criança, lembro-me bem, as mães saiam de casa e assentavam geralmente numa pontinha de grama ou numa pedra ali existente, até na terra batida quando quisessem. Ali, passávamos bem aquecidos e alegres durante boa parte da manhã. Chegávamos tremendo de frio (alguns diziam tiritando), e voltávamos para dentro de casa satisfeitos da vida. O melhor de tudo era a contação de casos. Cada uma queria contar o seu. Muitas vezes eram os sonhos da noite anterior, na maioria onirismos da vida cotidiana. Mas, as crianças, paralelamente, tinham ali seu palanque. Alteavam a voz para fazer valer seu caso. A maioria das vezes eram vantagens corriqueiras como brinquedos ou recordes em brincadeiras.
A rua era local, onde reuniam, todas as manhãs na época do frio, mas era também local de convívio social, na época do calor, desde que o tempo estivesse seco. A chuva trazia a obrigação de ficar dentro de casa. Ao cair da noite era bem comum, mesmo no centro da cidade, as pessoas colocarem as cadeiras no passeio e juntarem-se aos vizinhos para uma conversa geralmente saudável e amistosa. O visual dessa reunião dava a impressão de prazer, saúde e paz. Havia sorrisos discretos e palavras macias e suaves. Na periferia, também as famílias se encontravam, mas o que marcava mais a vida no espaço público eram jovens e crianças com suas brincadeiras e cantorias de roda. As cantigas de roda gravadas no folclore nacional deixaram saudades para o resto da vida. Muitas vezes, o pique de esconder e de pegar eram também os folguedos da meninada. Algumas brincadeiras estimulavam os exercícios de correr, como o “Brasil contra Alemanha”, “Onde Está a Margarida” “De Marré Marré” e outras. A rua servia até para contar histórias e outras brincadeiras como adivinhações e contação de histórias. No centro, os meninos usavam os passeios ou calçadas, onde houvesse muro para jogar tampinha ou birosca, com as quais disputavam quem chegava mais próximo da parede ou muro.
Durante o dia, especialmente aos domingos e feriados a rua na periferia era usada também como local de esportes, principalmente o futebol, que poderia começar com o gol a gol, de dois jogadores, um de cada lado para dentro de poucos minutos juntar um grupo de crianças e formar dois times denominados ironicamente de “arranca tocos” e “quebra canelas”.
O gol era marcado por duas pedras e a bola poderia ser desde laranjas murchas, bolas de meia e, mais raras, as bolas de capotão que custavam dinheiro. As bolas de meia quando caprichosamente costuradas pelas mães eram objetos de apego e propriedade. Algumas bolas duravam semanas. Algumas vezes, mais à tardinha, jogavam-se cabo de guerra, boizinho passa aqui e peteca, feita com palha de milho ou casca de bananeira.
Ficaria satisfeito se pudesse lembrar exemplos que retratassem motivos que viessem a ser imitados. Gostaria muito que os logradouros públicos voltassem a ser espaços para prazerosos momentos de lazer compartilhado. É o que nos leva a recordação daqueles momentos simples mas de grande simbolismo.
Talvez ainda seja possível voltar estes momentos nas ruas de lazer que se tenta implantar hoje em muitos bairros das grandes cidades. Vamos sonhar em recuperar as boas coisas do passado.
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