IV – São Romão: tradições religiosas e culturais

Publicado por Padre Joao Delco Mesquita Penna 6 de fevereiro de 2012

Da série Peregrinações Religiosas no Grande Sertão

 

A cidade de São Romão, situada na região norte do Estado de Minas Gerais, localizada às margens do Rio São Francisco, no circuito turístico Urucuia Grande Sertão, é cidade berço de antigas tradições religiosas, terra de um povo que é dono de uma riqueza cultural inigualável de diversidades de expressões da fé vivenciada na religiosidade popular. Segundo os historiadores, considerada uma das cidades mais importantes do sertão mineiro do século XVIII, foi palco de violentas batalhas travadas entre foragidos da justiça de todo o Brasil e de Portugal com os Índios nômades, aldeados e escravos foragidos. Mais tarde foi marcada pelo inconformismo perante o jugo colonial, quando explodiu a revolução do sertão, primeira revolta contra a coroa portuguesa, que transformou o lugarejo num cenário de lutas. Os seus primeiros habitantes foram os Índios Caiapós, antigos moradores da ilha situada em frente à cidade, que segundo relatos foram expulsos da terra e dizimados em sua cultura e tradições pelos colonizadores.

No decorrer da história, São Romão foi se tornando palco de diversas expressões de fé da religião do povo. A pequena cidade tem como maior patrimônio, o legado cultural dos antepassados, indígenas, africanos e portugueses. Talvez influenciados por seus primeiros colonizadores e evangelizadores, iniciou-se uma grande devoção a Santo Antonio que por muito tempo foi o padroeiro do lugar! Hoje entre tantas festas de sua tradição religiosa merece destaque a festa de Nossa Senhora do Rosário. A celebração centenária acontece na tradicional Igreja do Rosário, no inicio do mês de outubro, com suas tradições de reinados. Rei e Rainha desfilam em cortejo pelas ruas da cidade numa majestosa homenagem à mãe dos povos Negros, a Senhora do Rosário.

A cada ano o povo do lugar e visitantes sentem o coração pulsar de entusiasmo e animação à espera das festividades, que vai desde os alegóricos movimentos da Cavalhada até as celebrações litúrgicas com levantamento do mastro e procissões. As referidas festividades acontecem sempre animadas pela banda de música Sete de Setembro, que alegra as manhãs com suas alvoradas e acompanha todos os atos durante o evento.

Outra notável alegoria é a divertida dança folclórica do congado e dos caboclos. O congado é composto de um grupo de dançarinos vestidos a caráter, com caixas e pandeiros, que emociona a todos com seus gingados e cantigas diversificadas, entre elas as que recordam os conflitos dos povos negros com a sociedade da época, inclusive com a Igreja oficial. A cavalhada, numa reverente homenagem à protetora dos negros do sertão, circula ao redor da Igreja numa animadíssima alegoria, com os animais enfeitados nas cores vermelho e verde, acompanhados com o soar dos quinzos, surpreendendo com a figura cômica e atrapalhada do palhaço Zé Bode, fazendo todos cair na gargalhada. Depois da apresentação, segue num ritual festivo para as residências do Rei e da Rainha, onde são servidos deliciosos doces, em sua maioria de frutos do cerrado.

A dança dos caboclos faz mergulhar na história. Eles também vestidos a caráter, com saiotes e cocares indígenas, cantam e dançam durante procissões e cortejos pelas ruas da cidade, vibrando seus arcos e flechas, fazendo emergir a memória dos primeiros habitantes do lugar.

São Romão, também cultiva as tradições da Folias de Reis, do São Gonçalo do Batuque e do Boi de Reis. O batuque, dança de origem africana, caracterizada por requebrados, palmas e sapateados acompanhados por cantigas ritmadas por um instrumento musical chamado roncador, foi imortalizado pela figura da dona Maria do Batuque que por muitos anos também comandou o Boi de Reis, arrastando centenas de pessoas pelas ruas da cidade alegrando as noites de Janeiro.

Outra festa que está tomando proporções surpreendentes tanto de público como de infraestrutura, são as cavalgadas de São Sebastião lideradas pelo jovem advogado Dr. Marcelo Meireles. A cavalgada de São Sebastião, a cada dia 20 de janeiro, reúne centenas de cavaleiros e cavaleiras vindos do interior do município e de toda a região.

Vale lembrar que segundo as versões de alguns estudiosos, o início das cavalgadas tem como ponto de partida a domesticação dos cavalos ocorridas por toda Europa, Norte da África e principalmente no Oriente Médio. No Brasil as Cavalgadas foram introduzidas inicialmente como esporte, o que as fez crescer nas cidades do interior, trazendo muitos adeptos para esta prática. Hoje as cavalgadas são realizadas por motivos diversos, religiosos, turismo ecológico, esportivo, cívico ou por simples diversão. No Norte de Minas Gerais as cavalgadas por motivação religiosas caiu no gosto do povão, atingindo todas as classes sociais e faixas etárias, indo desde as lideranças políticas até o mais simples lavrador. Numerosas procissões a cavalo ocorrem no decorrer do ano rumo aos tradicionais centros de peregrinação das diversas regiões e também durante as festas de santos populares.

A cavalgada de São Sebastião em São Romão inicia-se sempre na Praça da Estação Rodoviária no inicio da manhã, com a recepção dos cavaleiros que vão formando o cortejo, tendo à frente a imagem do santo, até o balneário Riacho da Ponte, onde acontecem os Shows de artistas regionais e a festa propriamente dita, com muita comida e bebida, sempre distribuídos de forma gratuita. No dia seguinte acontece a festividade na sede da paróquia com o levantamento do Mastro, missa, procissão e encerramento com a escolha dos festeiros do próximo ano.

Contudo, seja qual for a motivação, devoção, turismo ou diversão, os cavaleiros de São Sebastião sonham com a chegada do dia da festa para cavalgar alegremente por ruas e estradas, participando de uma bela experiência de convivência humana.

São Romão conta ainda com a mais bela área de lazer da região, o balneário situado às margens da Vereda do Riacho da Ponte, ponto turístico, que, com suas águas cristalinas, atrai milhares de pessoas em dias festivos e feriados. Lugar especial para descanso, retiros espirituais e ecoturismo. Poderá se tornar um verdadeiro Oásis se, através de campanhas educativas junto à população e ao poder público, atentarmos para a preservação ambiental e proteção do precioso manancial.

Historicamente o Riacho da Ponte foi comunidade preferida para a realização de celebrações sacramentais. Católicos vinham de diversas regiões do extenso município para assistir as missas, fazer confissões, batizados, casamentos, pagar promessas e fazer a primeira comunhão, na majestosa capelinha dedicada a Santa Terezinha, que atualmente está precisando de reformas.

Finalmente caro leitor, penso que São Romão é sem dúvida palco milenar de grandes manifestações religiosas com valor histórico e cultural inigualável. Queira Deus que a cultura religiosa popular continue viva, frente aos modismos hedonistas e consumistas da grande midia que busca audiência fácil.

Comentários
  • Donizete Caxito 3573 dias atrás

    Gildete Alves Santa Rosa,Jorge Alves Santa Rosa, já é falecido há muitos anos, e Teresiha tambem,mas em São Romão tem os filhos e netos que ainda moram em na cidade.

  • zulu(claudeci ) 3742 dias atrás

    Nasci em São Romão em 1978 já morei em varias cidades do Brasil, hoje moro no estado do PARÁ, mas tenho um carinho muito especial por SÃO ROMÃO; espero que t/d de bom aconteça a SÃO ROMÃO e todos que ai moram, grande parte da minha familia ainda mora ai. Sendo minha vovó Maria, tia Geralda, Joaquim, Cristino, Herculana e familia na Lagoa Comprida. SAUDADES SÃO ROMÃO!!!!

  • Raquel da silva 3750 dias atrás

    Adorei a historia de São Romão, é uma cidade muito linda sempre que posso visito, a minha mãe “Isenir Alves” nasceu nessa cidade e tenho também minha avó, tias e muito parente em São Romão, espero que São Romão venha a ser divulgada no Brasil todo e até no mundo. Parabéns São Romão.

  • pedro reis 3766 dias atrás

    Parabéns padre João pela divulgação da história da nossa querida São Romão

  • Donizete Caxito 3768 dias atrás

    São Romão minha terra natal, onde eu tive o prazer de ser Rei da festa de N.S. do Rosário. Fui responsável pela restauração da Banda Sete de Setembro com as mortes dos músicos mais velhos, como Manoel Bispo, meu querido e saudoso pai Wilson Caxito, Pedro Bispo, Gerônimo Bispo, Epifanio Bispo, Francisco Bispo, Jove Guedes, Arlindo Leite, Tomaz Frois,e outros músicos. Comecei as primeiras lições de música com meu tio Manoel Bispo regente da banda, e terminei de aprender música com meu pai Wilson, que me passou o trompete. Com as ausências desses músicos veio o fim da saudosa Banda Sete de Setembro, coma era chamada de furiosa, ou a banda dos Bispos. Hoje eu moro em Sarzedo, M. Gerais, e não exerço mais a atividade de músico. Trabalho como motorista profissional em transporte rodoviário de passageiros.

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