Fatores para a evolução da geração per capita de resíduos sólidos no Brasil

Publicado por Heliana Kátia Tavares Campos 15 de março de 2013

Haveria um modelo de desenvolvimento que conciliasse o aumento de consumo das famílias e ao mesmo tempo reduzisse a geração per capita de resíduos sólidos? A recente Política Nacional de Resíduos Sólidos ― Lei no 12.305/2010 ― hierarquiza a não geração, seguida da redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos. A logística reversa e a responsabilidade compartilhada, instituídas na lei, são estratégicas na implantação de um modelo de produção e consumo sustentáveis. As responsabilidades do gerador, do importador, do distribuidor, do comerciante, assim como do consumidor do produto, com um fluxo reverso dos resíduos, podem impactar positivamente este objetivo. No entanto, este caminho ainda não foi construído e mesmo nos países da Comunidade Européia, com suas diretivas rigorosas, os resultados não são alvissareiros.

Para muitos a chave do problema pode estar na implantação da política dos 3 Rs (Reduzir, Reutilizar e Reciclar). Para se reduzir a geração dos resíduos sólidos, no entanto, há que se instituir a produção limpa, a logística reversa, a responsabilidade compartilhada e o consumo sustentável. Este modelo pode ser considerado contraditório no Brasil. Para reduzir as extraordinárias desigualdades sociais são necessários recursos advindos da arrecadação de impostos gerados, entre outros, pela produção de bens de consumo. Para a população abastada é preciso reduzir a avidez pelo consumo que é em geral visto como sinônimo de felicidade. Para reutilizar é preciso repensar o design dos produtos, pois os mesmos são muitas vezes desenhados para uso e descarte. São às vezes feitos com obsolescência programada. O último R ― de Reciclar ― é o que tem conquistado melhores resultados no Brasil, em especial por ser um negócio. Pode significar lucro para o empresário e renda para o catador de material reciclável. É nele que se encontra a coleta seletiva, a triagem, a prensagem, o enfardamento e a comercialização dos resíduos sólidos secos. No entanto, com tantos catadores autônomos e sucateiros informais não registrados pela PNSB, Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, pela pesquisa CEMPRE/CICLOSOFT do Compromisso Empresarial pela Reciclagem e pelo SNIS, Sistema Nacional de Informações sobre o Saneamento, é difícil avaliar o seu impacto. Visando a identificação dos fatores que podem influir direta ou indiretamente na geração per capita de resíduos sólidos no Brasil, são apontadas a seguir algumas hipóteses.

 

Fatores de aumento da geração per capita de resíduos sólidos no Brasil

Alguns fatores que podem estar contribuindo para o aumento da geração per capita dos resíduos sólidos:

  • aumento do emprego e elevação da massa salarial;
  • políticas de enfrentamento da pobreza ― PBF, Programa Bolsa Família e BPC, Beneficio de Prestação Continuada;
  • redução do número de pessoas por domicílio e por família;
  • maior participação da mulher no mercado de trabalho;
  • recente fluxo da migração de nordestinos de volta do Sul para o Nordeste, estimulando novos hábitos de consumo;
  • maior facilidade na obtenção de crédito para o consumo;
  • não cobrança pelos serviços de coleta e manejo dos resíduos sólidos aos munícipes;
  • estímulo frenético ao consumo pelos veículos de comunicação;
  • uso indiscriminado de produtos descartáveis.

Fatores de redução da geração per capita de resíduos sólidos no Brasil

Alguns fatores podem contribuir para a redução efetiva da massa de resíduos sólidos gerados, desde que implantados de forma articulada e abrangente. Deve-se, no entanto separar a redução efetiva da redução aparente do consumo. Se um mesmo alimento é comercializado semiprocessado, o seu consumo pode implicar na geração de resíduo sólido com menos peso específico e na redução da massa de resíduos sólidos gerada. Representa, portanto, uma aparente redução do consumo em função do menor peso dos resíduos. No entanto, pode até representar a geração de resíduos sólidos mais complexos em função do tipo de embalagem (isopor e tetra pack).

Os fatores que supostamente podem reduzir o peso específico dos resíduos sólidos seriam:

  • aumento do processo de industrialização dos alimentos;
  • aumento do consumo de produtos semiprocessados.

Os fatores que supostamente podem reduzir a quantidade de resíduos sólidos gerados seriam:

  • a aplicação dos princípios da logística reversa e da responsabilidade compartilhada, instituídas pela Lei no12.305, de 2 de agosto de 2010, da Política Nacional de Resíduos Sólidos (prevenção no processo de produção de bens, no design dos produtos, novo comportamento dos consumidores);
  • implantação de instrumentos econômicos para a indústria, o município e o cidadão;
  • incentivo para a implantação da compostagem domiciliar ou vicinal;
  • aumento do número de refrigeradores domiciliares com redução dos resíduos orgânicos;
  • ampliação dos serviços de coleta para as famílias com menor poder aquisitivo;
  • aplicação dos princípios e programas de educação ambiental em escolas;
  • campanhas de mobilização da sociedade para o consumo consciente;
  • cobrança pelos serviços de coleta de forma proporcional aos resíduos gerados;
  • uso de produtos com embalagens retornáveis;
  • aplicação dos princípios da A3P, Agenda Ambiental da Administração Pública.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme demonstrado no texto a geração per capita e a caracterização dos resíduos sólidos tem a ver com o desenvolvimento econômico de um país, o poder aquisitivo e o correspondente consumo de uma população. Famílias mais abastadas, cidades maiores e países mais ricos apresentam indicadores de geração per capita de resíduos sólidos superiores às famílias mais pobres, cidades menores e países em desenvolvimento. Tem havido em vários países desenvolvidos uma preocupação crescente com a redução da geração per capita dos resíduos ou a sua estabilização, com metas estabelecidas, e instrumentos econômicos implantados. No entanto, o alcance da redução da geração per capita de resíduos sólidos depende de uma série de fatores que poderão permitir uma mudança mais significativa nos atuais padrões de produção e consumo e surtir os efeitos desejados. Até o ano 2000, quando a geração média per capita de resíduos sólidos era de 514 kg/habitante/ano nos países estudados pela OCDE, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, ou seja, os países mais ricos do mundo, a geração de resíduos sólidos cresceu em conformidade com o aumento do PIB. A partir daí percebe-se o crescimento mais acelerado do PIB e uma desaceleração do crescimento da geração de resíduos sólidos e uma redução ainda maior do crescimento populacional. Há, no entanto, apesar de todos os esforços feitos, uma estimativa de crescimento da geração per capita de resíduos sólidos dos países estudados para 611 kg/hab/ano para 2015, 635 para 2020, 664 para 2025 e 694 para 2030. Fica a indagação sobre um limite para o crescimento da geração per capita de resíduos sólidos, uma vez que o estudo não aponta para uma estabilização dos valores de geração per capita nos países desenvolvidos.

No caso do Brasil, a grande novidade pode ser considerada a promulgação da Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos de boa qualidade. Com prioridade dada à redução na geração, deve-se refletir sobre onde reduzir, o que reduzir e como sustentar o processo. Com a implementação da lei, poderá haver um grande avanço no sentido de uma gestão sustentável dos resíduos sólidos no país e da sua consequente estabilização ou até mesmo redução, alterando o sentido do vetor de crescimento. Para se buscar a efetiva redução e ou estabilização da geração per capita, é necessária a discussão e implantação de instrumentos legais e de gestão, com grande atenção a ser dispensada à regulação e fiscalização dos serviços de coleta.

Na descrição de fatores que podem contribuir na variação da geração per capita dos resíduos sólidos no Brasil, aqueles que poderão favorecer o aumento são, em uma primeira avaliação, mais abrangentes do que aqueles que poderão contribuir para a redução. Os passos a serem tomados para o estudo da viabilidade da redução dependerão de um esforço muito maior, pois ainda estão implantados de forma pontual e fragmentada.

Não se tem ainda um estudo que demonstre uma avaliação precisa das tendências da evolução da geração per capita de resíduos sólidos no Brasil, se irá e quando estabilizará este indicador, se está próximo ou não de ser alcançado o consumo consciente e sustentável e a respectiva geração de resíduos sólidos em padrões ambientais aceitáveis. Percebe-se que o atual modelo de desenvolvimento pressupõe o crescimento da renda dos mais pobres e do consequente consumo, num grande esforço para redução da pobreza, da miséria e das desigualdades sociais. Quanto às políticas que possam estimular o consumo sustentável ainda se está engatinhando. Percebe-se, portanto, que os fatores econômicos, sociais e culturais que podem implicar no aumento da geração de resíduos sólidos são mais significativos do que aqueles que podem colaborar na sua redução.

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