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(continuação da parte II)
Segundo a UNICEF, aproximadamente 2,8 milhões de crianças morrem anualmente devido à desnutrição. Isso significa que, diariamente, cerca de 7.600 crianças perdem a vida. Se compararmos essa quantidade de mortes com as resultantes da queda das Torres Gêmeas, seria como se cinco torres caíssem a cada dia, mas apenas com crianças, sem adultos. A diferença é que essas “torres” não aparecem na televisão nem nos principais meios de comunicação, mas infelizmente são reais.
A semente de cânhamo é uma excelente fonte de proteínas de alta qualidade. Não entrarei em muitos detalhes técnicos, mas ela contém os nove aminoácidos essenciais que a ciência nos diz serem necessários ingerir através da dieta. Além disso, possui uma proporção ideal de ácidos graxos essenciais Ômega 3 e 6, algo difícil de encontrar em fontes vegetais. Ingerir essas gorduras saudáveis ajuda a reduzir o risco de doenças cardiovasculares, a principal causa de morte em todo o mundo. Também está associado à prevenção de distúrbios neurodegenerativos, e foi observado que uma proporção adequada de Ômega 3 e 6 na dieta ajuda a modular a inflamação e a manter uma resposta imunológica saudável. Além disso, a semente é uma boa fonte de fibras, vitaminas e minerais. É comumente chamada de “superalimento”.
O cultivo desta planta é conhecido por sua alta adaptabilidade a diferentes tipos de solo e climas. Comparado a outros cultivos como arroz, trigo ou milho, requer menos água e tende a ser mais resistente a pragas. Como se isso não bastasse, melhora a estrutura do solo. Encaixa-se perfeitamente na definição de uma cultura ecológica, considerando que diferentes partes da planta podem ser usadas para diferentes fins.
Quando soube de tudo isso, foi inevitável pensar em países e comunidades com altas taxas de desnutrição. Acho indignante que seja proibido cultivar este excelente alimento em populações vulneráveis apenas pelo fato de que sua flor fêmea tem efeitos psicoativos. Estou falando de pessoas que literalmente morrem de fome e que poderiam, com um mínimo de empatia, ter a oportunidade de decidir cultivar cânhamo sem serem presas.
A semente em si não tem nenhum efeito psicoativo. O consumo dentro de uma dieta equilibrada só traz benefícios para a saúde. Se também considerarmos as vantagens ambientais, arrisco-me a dizer que a proibição é uma estupidez em qualquer lugar do mundo, dada a baixa toxicidade da planta, mesmo quando usada como droga, mas é particularmente estúpida e cruel em comunidades onde a fome e a falta de recursos são uma realidade. Lembre-se de que o fato de essas mortes não aparecerem nos noticiários não significa que não existam.
Não há uma única morte clínica no mundo atribuída a uma overdose de canabis. Não se pode dizer o mesmo do álcool, aspirina ou paracetamol. Isso não significa que não existam riscos ou que possa ser usado por qualquer pessoa, de qualquer idade, em qualquer ambiente ou com qualquer dose. O fogo pode permitir que você cozinhe ou queime sua casa. Como é usado fará a diferença. O mesmo se aplica ao uso de uma faca ou da canabis. Escreverei com mais detalhes sobre isso em artigos futuros.
É lógico que eu sou a favor do uso medicinal, mas também faz muito sentido prevenir doenças através de uma dieta saudável, onde essa pequena e maravilhosa semente poderia desempenhar um papel fundamental em populações vulneráveis.
Vejo esta planta como um recurso extremamente valioso e versátil. Até quando aceitaremos leis estúpidas e injustas? O fato de algo ser legal não significa que seja positivo ou ético. Há menos de cem anos, as mulheres não podiam votar em muitos países ao redor do mundo. Era legal, mas era justo? Nos Estados Unidos, existiam leis tão racistas que tinham banheiros, transporte e escolas separados para brancos e afrodescendentes. Era legal, mas era justo?
Espero que chegue um dia em que a criminalização do cultivo de cânhamo seja vista da mesma forma que vemos atualmente a proibição do voto feminino ou a impossibilidade de usar um banheiro apenas porque não se tem certa cor de pele: algo evidentemente estúpido!
(continua na parte IV)