Zé Gato ao lado de Rubens Bicalho, autor desconhecido
Esta crônica tem a ousada pretensão de falar sobre domínio popular, sucesso e plágio. Mas é, sobretudo, uma homenagem a um cidadão especial da nossa Itacambira, no Norte de Minas, o Zé Gato. Quem o conheceu sabe ser impossível falar dele sem fazer menção à famosa marchinha carnavalesca que cantava:
“Ó, jardineira,
Por que estás tão triste?
Mas o que foi
que te aconteceu?
Foi a Camélia que caiu do galho
Deu dois suspiros e depois morreu!”
Lembro-me, na distante infância em minha pequena cidade, de ver o Zé Gato zanzando pelas ruas, nos seus passos trôpegos, talvez pela cachacinha, cantarolando a Jardineira. Não. Zé Gato não era doido. Acredito que aquele matutar solitário em seus monólogos e cantorias se dava mais pelos efeitos etílicos da “marvada” ou, quem sabe, por seus fantasmas pessoais. Vai saber, não é mesmo?
“Vem, jardineeeira!
Vem, meu amor!
Não fique triste que este mundo é todo seu
Tu és muito mais bonita
Que a Camélia que morreu!”
Assim como Zé Gato, a marchinha da Jardineira teve história insólita e nebulosa. Gravada em 1939, na voz do já famoso Orlando Silva, ela foi apresentada pelo compositor Benedito Lacerda, com letra de Humberto Couto, um baiano arretado radicado no Rio de Janeiro. Vale lembrar que o Rio naquela época era o berço dos sucessos, endereço das grandes rádios e gravadoras do país, onde tudo fervilhava. A Jardineira tornou-se sucesso estrondoso naquele mesmo ano de 1939. Só que, junto com o sucesso febril, vieram os problemas. Apareceu gente, de norte a sul do país, reclamando a autoria da marcha. Teve uma Maria das Dores, lá das Alagoas e até um Padre Frederico, lá dos pampas gaúchos. Enfim, todo mundo queria ser pai e mãe da Jardineira. Foram acusações de plágio, a torto e a direito.
Acontece que, quando da apresentação da letra pelo Humberto Couto, o baiano, ele informou ser a marcha uma canção que as mães baianas usavam para embalar seus filhos. Ele fizera apenas algumas alterações e adaptações para o ritmo carnavalesco. E pronto. Sendo tratada como adaptação de música de domínio popular, o ato não constituía crime, nem plágio, nem nada.
Enfim, a Jardineira fez sucesso até nos tribunais da época. E nunca se soube seu real autor.
Eu, particularmente, escolhi como dono oficial da Jardineira, o inesquecível Zé Gato. Nada mais justo. Nas minhas leituras pessoais sobre Itacambira, soube que Zé Gato tornou-se nome de cachoeira, na linda região do Curiango.
Sobre seus últimos dias aqui na terra e de onde tinha vindo, eu nunca soube.
Mas, algo é certo: Zé Gato e a “sua” Jardineira moram nas melhores lembranças de quem os conheceu.
Salve, Zé!