Parece folclore, mas quem me contou jura que aconteceu nos anos 60.
O fazendeiro pão-duro, mal vestido e barba por fazer, foi à cidade grande tratar de uns negócios. Ao entardecer, postou-se ao lado das Lojas Americanas, junto de um conhecido, à espera do ônibus de volta. Encostou-se na parede e cochilou com o velho chapéu de feltro na mão. Alguém passou e, julgando que fosse um mendigo, lançou uma esmola no chapéu. Pouco depois, o fazendeiro acorda e vê a nota de dois cruzeiros no chapéu. Prontamente, comentou:
– “Rapaz, isso dá dinheiro!”
Folclore ou realidade, serve bem de parábola para a atitude dominante em nossos dias: não importa o que seja, desde que “dê dinheiro”. O lucro e a vantagem material acabam por justificar qualquer comportamento. Trata-se de um princípio profundamente entranhado na tábua de “valores” que orienta a sociedade.
Por exemplo, quando é hora de escolher uma profissão, ainda existem aqueles que se deixam orientar por uma inclinação pessoal, um sonho irresistível, uma vocação divina, uma missão irrecusável. Mas são exceções. Em geral, o critério da escolha profissional responde à pergunta: que atividade está “dando dinheiro”? Chegamos ao ponto em que existem publicações e pesquisas a respeito dos “nichos” econômicos a serem explorados no momento.
É verdade que os próprios familiares acabam reforçando este viés materialista quando se opõem às intenções de um jovem apaixonado por algo belo, mas pouco promissor em termos financeiros: “Isto não dá camisa pra ninguém!”
Refletindo a sociedade maior, também no santuário das Igrejas, aqui e ali, parece prevalecer o mesmo critério. Na hora de reeditar um livro de valor espiritual, surge a questão para a editora cristã: valerá a pena? Teremos retorno financeiro? E a gravadora cristã investe no artista consagrado, mas hesita em apostar em iniciantes.
Mesmo os compositores e cantores que se apresentam como cristãos costumam adotar os mesmos procedimentos dos aparentemente pagãos, fazendo da expectativa de lucro o motor de sua atividade artística. Em consequência, sua “arte” ficará fora do alcance das comunidades mais pobres…
Em todos estes casos, o valor econômico se sobrepõe à intenção de anunciar a Boa Nova, transmitir a fé, semear a esperança.
Depois de tudo isso, cabe ao menos um sincero exame de consciência: por que eu faço aquilo que estou fazendo? É só por dinheiro? Em profundidade, que é que me move e justifica o meu trabalho? Serei feliz ao insistir neste caminho?
Em tempo: entre os doze apóstolos, havia um financista. Parece que foi exatamente o que vendeu seu Mestre por trinta moedas de prata…