Outro dia, no noticiário da TV Cultura, que vejo na E-Paraná, o assunto era a devastação do furacão Matthew no infeliz Haiti. Leandro Karnal, filósofo, careca e professor da UNICAMP, aproveitou a deixa para fazer teologia. Em outros termos, com um risinho sardônico, perguntou:
– “Como é que ficam as pessoas que dizem que Deus é bom? Como é que Deus permite assim um desastre com tantas mortes? Parece que Deus criou o mundo e disse aos homens: se virem!”
Para o douto comentarista, um tufão é a prova cabal da inexistência de Deus. De fato, é assunto para filosofar. Talvez seja este o maior desafio à filosofia de todos os tempos: a origem do mal. E, dentro da teologia propriamente dita, aí está o “mysterium iniquitatis”, o mistério do mal. Como é que um Deus bom permite o mal?
Claro, o filósofo careca não teve tempo para dizer que o Cosmo não está pronto, mas ainda evolui em busca de sua forma final. Os pessimistas dizem que será um big-bang invertido. Karnal não teve tempo para lembrar que toda criatura é imperfeita. Se o Criador – ele, sim, perfeito – criasse um universo igualmente perfeito, teria criado outro deus. Karnal poderia ter lembrado que boa parte dos males que nos assolam são devidos ao mau uso da liberdade concedida ao homem pelo Criador. Aqui, alguns acusam Deus de temerário por não ter criado autômatos em vez de pessoas…
Mas há outras carecas cintilando entre as constelações televisivas. Dois dias depois, no mesmo noticiário, lá estava a brilhante cabeça de Luís Felipe Pondé, filósofo, calvo e professor de Ciências da Religião na PUC-SP. Desta vez, o tópico era a violência na sociedade atual. O âncora pedia palpites sobre os meios de conter o terremoto da violência no Haiti brasileiro.
Como sempre, fala-se em urbanizar as favelas, investir na educação etc. Mas Pondé teve a coragem – a ousadia, reconheçamos! – de falar em religião. E, sem pressa, para arrepios de muitos teóricos sociais, ele insistiu que as pessoas que praticam uma religião são gente mais pacífica. Frisou que a falta de religião é um dos vetores que culminam no tsunami que devasta especialmente a população mais jovem.
Assíduo espectador do noticiário da TV Cultura, creio que eu nunca vi as duas carecas juntas no mesmo dia. Mas seria interessante vê-las lado a lado, um dia desses, para assistir ao entrechoque de dois crânios luzidios, em cujo interior a massa cinzenta trabalha e teima e lima e sofre e sua, como disse Olavo Bilac.
Em tempo: Bilac tinha vasta cabeleira…