Fronteiras

Publicado por Carlos Bitencourt Almeida 29 de dezembro de 2009

Fronteiras

Dorme em nós um poder de alargar-se, expandir-se, fundir-se, deixar-se tocar. Há momentos em que nossas rígidas fronteiras se dissolvem e deixamos a vida entrar. O isolamento é dor, a vida fica árida quando nos sentimos demasiado sólidos, separados de tudo que nos cerca. Quando o milagre acontece nos tornamos vento, nos espalhamos no mundo, o mundo penetra em nós.

Às vezes, tocando alguém que amamos, sentimos que algo se mistura, como se a rígida fronteira entre meu corpo e o teu se apagasse e mergulhamos em algo impalpável, porém cheio de vida, de essência luminosa, de beleza. Somos preenchidos por esta luz e beleza.

Algumas vezes, ouvindo uma música sublime, nosso ser se abre e a música ressoa dentro de nós, vive em nós, como se por momentos fôssemos uma catedral e dentro dela a música ressoa, se entrelaça com o nosso ser, nos transmite beleza, harmonia, pureza, poder.

A beleza visual da natureza, da arte, de uma pessoa que amamos ou admiramos, pode, em ocasiões especiais, derramar-se dentro de nós. Resplandece então, fulgura, nos nutre, e uma doce e intensa alegria nos preenche.

 Quando somos capazes de sentir amor por alguém, de novo é uma expansão. Acolhemos em nosso interior aquele que está diante de nós. Nos tornamos espaço e dentro deste vazio vivo podemos ouvir, recebemos, sentimos ternura, compaixão, alegria.

Para alguns o estudo pode ser um caminho. Ler e refletir sobre obras que tentam compreender o mistério, o sentido da vida, pode, em alguns momentos, abrir portas. Uma clareza que mistura inteligência e intuição nos invade e nos deixa certezas que o pensar habitualmente não nos dá.

Para outros pode ser que no silêncio de uma igreja, no recolhimento de uma prece intensa e silenciosa, num momento de dor extrema, subitamente nos abrimos, somos tocados, algo maior nos envolve, já não estamos sós. Uma presença misteriosa infunde em nós calma, alegria, energia, coragem.

O estranho mistério destas vivências é a sua fugacidade. Acontecem de vez em quando e são desobedientes à nossa vontade, ao nosso desejo. Vem e vão seguindo leis próprias, que apenas parcialmente conseguimos compreender. São como relâmpagos numa noite escura. Nos fazem vislumbrar um outro mundo, um outro modo de sentir a vida, mas sempre de novo o poder de permanecer neste outro mundo nos escapa. Voltamos ao isolamento, voltamos a nos sentir sólidos, separados do mundo e das pessoas que nos cercam. A doce lembrança fica, marcada em fogo dentro de nós, nos trazendo a certeza de que podemos ser mais do que somos habitualmente.

Comentários
  • Sânia Maria campos 5447 dias atrás

    Olá Carlos,
    Grata por nos presentear neste final de ano com este texto que fala de algo que em vários momentos vivemos e que eu nunca consigo expressar com palavras, transmitir.É uma experiência pessoal única, que nos preenche de luz.Que em 2010 o vislumbre deste outro mundo de unidade e paz nos guie. Abraço, Sânia

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