Quando passávamos por ele,
levantava os olhos para nós;
era atenção, somente atenção,
o que estava a nos pedir.
Quando ao fim do dia
suas magras mãos
em nossa direção estendia,
compaixão é o que implorava.
Víamos lágrimas
a escorrer nas faces sujas,
víamos pés desnudos
pisando a terra pedregosa.
Ainda criança, fugiu,
mas antes de partir
por inúmeras vezes
parou a olhar para trás.
Expectativa inútil
de que algo ocorresse:
um aceno,
um gesto amistoso.
Mas não nos iludamos,
retornará um dia
numa horda de bárbaros,
em fúria apocalíptica.
E então, sem compaixão,
sem dar ouvidos às nossas súplicas,
destroçará sem misericórdia
a cidadela dos indiferentes.
Comentários
De fato, precisamos mesmo, antes que seja tarde. E diria eu: antes de morrermos. E diria o Lucio: somos porque mudamos. E diria o Angelo: só seremos se mudarmos. Poetas vivem de fé, mesmo sem fé.
Novamente a verve bendita do poeta conclama os passantes deste vasto mundo vão, à instrospecção e devaneio, e percorrendo os ditames do misterioso e do inexplicado, buscar intensiva e profusamente, a mudança individual e coletiva estampada maravilhosamente por Rilke em boca grega: “passante, precisas modificar a tua vida”.