Durante cinco anos, participei de uma equipe de pastoral carcerária. Nosso campo de evangelização era a Casa de Detenção Dutra Ladeira, uma penitenciária de segurança máxima na Grande BH. Ali viviam 900 detentos.
Além do padre que nos acompanhava, éramos todos leigos, membros da Comunidade Católica Nova Aliança. Nossa coordenadora era uma delegada aposentada. Entre os outros evangelizadores, as mais diversas profissões: donas de casa, taxista, cabeleireiro, professora, analista de laboratório etc.
É preciso confessar que assumimos a missão com uma dose de medo (eram gente perigosa…) e de superioridade (eles são decaídos…). Em pouco tempo, precisamos passar por séria conversão.
Atrás das grades, havia jovens com idade para serem nossos filhos. Havia idosos de cabelos encanecidos. Mas, acima de tudo, os presidiários tinham sede de Deus. Eu percebia lágrimas durante a pregação. Em outros lugares, os fiéis ouviam e comentavam: “Gostei muito. Foi bom para mim. Foi gratificante…” Ali, não: apenas choravam.
Vez por outra, um deles confessava: “Se eu tivesse ouvido isto antes, não estaria aqui”. Outro dia, quando ia começar a missa, um dos “internos” estendeu-me um papelzinho com um nome:
– Pode rezar a missa nesta intenção?
– Sim… quem é ele? – perguntei.
– É o cara que eu matei…
Imaginem o meu choque! Após um tempo de ouvir e acolher a Palavra de Deus, o “bandido” se preocupava com a salvação eterna de sua vítima…
Deixei a equipe quando a Comunidade me confiou outras missões. Mas não posso esquecer as quartas-feiras daqueles cinco anos. Como apagar a visão do sacerdote que confessava os presos no cantinho do palco do auditório, enquanto cantávamos e pregávamos o Evangelho? Para que a confissão dos penitentes não fosse ouvida pelos presentes, o padre aproximava a cabeça bem perto do preso, sem levar em conta que muitos deles eram aidéticos ou tuberculosos. E Jesus chegava tão perto!…
Entre nós e eles, foi tecida uma grande afinidade. Quando Marleide aceitou preparar um pequeno grupo para a primeira comunhão, aquela dona de casa não imaginava que ficaria no reduzido espaço de uma estreita sacristia, cercada por doze assassinos… Sei que Jesus e os doze apóstolos formavam um grupo bem parecido.
Quem eram aqueles presidiários? Eram batizados como nós. Adotados pelo mesmo Pai. Templos do mesmo Espírito. Nós não podíamos arremessá-los previamente ao fogo do inferno e fazer de conta que não eram mais humanos. Eles eram Igreja…
Ah! Como é distorcida a nossa noção de Igreja! Gostamos de imaginar que somos um clube de sócios refinados, portadores de direitos e prontos a reclamar regalias.
Enquanto isso, o Corpo de Cristo sangra, o pobre geme, o presidiário se desespera. E nossa fé nos interpela a deixar o pequeno mundo de nossas conveniências.
De preferência, antes do Juízo Final…