Esse indivíduo chamado leigo – parte IX

Publicado por Antonio Carlos Santini 9 de agosto de 2018

Esse indivíduo chamado leigo – parte IX

Foto: Foyer de Charité

A via da cruz

A estrada “ativa” não é o único itinerário disponível para o fiel leigo. Sair a campo, cuidar do próximo, assumir missões – tudo isto pode trazer um lado agradável, como o reconhecimento, o aplauso, as realizações. Mas existe também – e muito mais “democrática” – uma estrada “passiva”.

O adjetivo “passivo” refere-se à “paixão”, isto é, ao sofrimento. Nesta via, a tarefa do cristão não consiste propriamente em agir, mas em sofrer. De sujeito, passa a objeto. Por mais espantoso que possa parecer ao (neo)pagão, é exatamente aqui que o cristão mais se identifica com Jesus, o homem da cruz.

Em geral, quando o sofrimento bate à nossa porta, a reação normal se manifesta na pergunta: “Por que eu?” Como se a cruz fosse um fardo inesperado – e inaceitável – na vida daqueles que pretendem seguir o Crucificado. Ora, este é o momento especial para nossa união com Cristo. A via que menos se presta a desvios e autoenganos.

Não tenho conhecimento de que os pastores se dediquem de modo especial a despertar os idosos e os enfermos para a importância de sua participação na cruz de Cristo. Quando os anos avançam e o corpo sofre, o idoso se sente inútil e se interroga sobre a “utilidade” em continuar vivo. É a hora de lembrá-lo da “oportunidade” de se unir à cruz de Cristo e, com ele, participar da redenção do mundo.

Padre Pio de Pietrelcina, já incluído no cânon dos santos, detalha o itinerário do sofrimento em nossa vida: “Primeiramente, aceita-se a dor, permitida por Deus, para reparar o passado, purificar a alma e vencer toda rejeição. Depois, acolhem-se os sofrimentos com ardor e determinação, com a alegria de percorrer com Cristo a via dolorosa, do Presépio ao Calvário. Admira-se, louva-se, ama-se todo estado doloroso de Jesus: da pobreza e do exílio, dos trabalhos ocultos da vida anônima, dos trabalhos extenuantes da vida pública e dos sofrimentos físicos e morais da longa e dolorosa Paixão”.

Exemplo acabado de participação na cruz de Cristo é a vida de uma leiga francesa, Marthe Robin, 1902-1981, cujo processo de beatificação está em fase final. Ela recebe um convite de Jesus: “Marthe, queres ser como eu?” À resposta afirmativa, segue-se um autêntico calvário: 50 anos paralisada em um pequeno divã, a progressiva cegueira, os estigmas e a experiência da Paixão de Jesus em seu próprio corpo, todas as semanas. Durante todo esse tempo, sem deglutição, Marthe não comeu nem bebeu nada, alimentando-se exclusivamente da Eucaristia, quando a hóstia era “aspirada” e desaparecia nela.

Marthe diz ao Pe. Livragne: “Todos os cristãos têm de participar na Paixão de Jesus, para completar em seu corpo aquilo que falta à Paixão do Cristo total. Eu não sou mais que um sinal, uma lembrança para os cristãos”.

Seu extremo estado de limitação e dependência não impediu que Marthe fundasse os Foyers de Charité – hoje 78 casas em 42 países – e atendesse individualmente ou em pequenos grupos a mais de 100.000 pessoas.

Santidade e sofrimento caminham juntos. “Os cristãos leigos e leigas que vivem em circunstâncias adversas, impossibilitados de uma atuação mais concreta, não se sintam fora da única missão da Igreja e tenham a consciência de que o sofrimento também é uma realidade aberta para a evangelização. Por meio do sofrimento, digam com São Paulo: ‘completo, na minha carne, o que falta às tribulações de Cristo em favor do seu Corpo que é a Igreja’. (Cl 1,24.) Por isso, tendo como referência o mistério do sofrimento de Cristo, realizem sua vocação de ser fonte de amor, luz e força para a Igreja e para a humanidade.” (Doc. 105, 192)

Comentários
  • Eudecia Matos 2321 dias atrás

    Segundo a doutrina espírita temos três coisas a fazer em nossa vida: pagar um débito, ou carma, um aprendizado e uma missão a cumprir. Para alguns o carma é mais pesado, pois estariam tentando evoluir mais rápido através do sofrimento. Tudo isso seria combinado perante o Conselho do Carma antes da reencarnação do espírito.

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