Em tempos de pandemia, espalha-se uma onda de suspeitas acerca das vacinas produzidas pelos laboratórios farmacêuticos. Como quase todo medo, há um fundo irracional nesta reação. Mas não podemos deixar de fazer interrogações acerca dessa suspeita. Por que a massa desconfia da ciência?
É um fato que a humanidade deve muito à ciência. Basta lembrar os benefícios derivados da descoberta de antibióticos, a proteção proporcionada pela vacina Sabin e a possibilidade de cirurgias que os anestésicos oferecem.
Mas a mesma folha tem no verso uma página obscura. Foi a ciência que parturejou a bomba atômica lançada sobre Hiroshima e Nagasaki. Foram cientistas que colaboraram com o III Reich e cometeram as conhecidas atrocidades dos experimentos nazistas: prisioneiros utilizados como cobaias em técnica de congelamento, inoculados com doenças contagiosas para testes de sorologia, produção de gases para eliminação de deficientes, ciganos e judeus.
Foram cientistas que usaram hormônios como dopping em atletas da Alemanha Oriental, produzindo recordes a curto prazo e cânceres a longo prazo. É à ciência que devemos a “pílula do dia seguinte”, abortivo responsável pela eliminação de milhões de embriões em todo o planeta. São estudiosos da ciência médica que recebem seu diploma e, a seguir, dedicam-se a ganhar dinheiro como abortistas.
Cada dia mais, o cientista se vê interrogado sobre os limites da ciência, confrontado com as tentações do lucro, do sucesso e do pragmatismo. Financiado por macroempresas farmacêuticas – autênticos polvos do capitalismo selvagem – o pesquisador nem sempre mantém os olhos fixos nos “fins” da ciência, e essa ausência de uma teleologia humana pode transformar os homens da ciência em predadores temíveis.
Documento da Pontifícia Academia para a Vida de 1999 assim reflete o assunto: “Nos últimos anos, impôs-se com força a questão do uso das novas biotecnologias para fins ligados à agricultura, à zootecnia, à medicina e à proteção do ambiente. As novas possibilidades oferecidas pelas atuais técnicas biológicas e biogenéticas suscitam, de um lado, esperanças e entusiasmos e, de outro, alarme e hostilidade. As aplicações das biotecnologias, sua liceidade do ponto de vista moral, suas consequências para a saúde do homem, seu impacto sobre o ambiente e sobre a economia, constituem objeto de estudo aprofundado e de vívido debate. Trata-se de questões controversas que envolvem cientistas e pesquisadores, políticos e legisladores, economistas e ambientalistas, produtores e consumidores. Os cristãos não são indiferentes a estas problemáticas, cônscios da importância dos valores em jogo”.
Enfim, quando a sociedade estiver convencida da responsabilidade ética dos cientistas e pesquisadores, provavelmente a desconfiança popular será substancialmente reduzida. E as vacinas serão sempre bem-vindas…
Comentários
“A ciência” pode ser definida como “o conjunto do conhecimento que passou pelo crivo do método científico e do conjunto de verificações realizadas pela comunidade de cientistas”, de modo que almeja estar razoavelmente ‘certificados. É como uma ‘nuvem consensual impessoalizada’. É também um conjunto de instrumentos que a humanidade pode utilizar. Não deve ser confundida com o cientista individual nem com os usos que dela fazem os cientistas individuais os estados, os tecnólogos, os exércitos etc. Para melhorar a humanidade estão a ética a cidadania e os humanismos, e a ciência se torna instrumental. Não se deve misturar as coisas, o que pode ser difícil.