Dia desses, em Pompéu, encontrei esta flor numa hortinha de fundo de quintal, derramando luz e poesia nos canteiros de verdura. O hortelão vai falando com entusiasmo do seu mundo, da sua vivência com as plantas e com a mulher, com quem vive há mais de trinta anos.
Ao me deparar com a flor, sou tomada de duplo encanto. E comento com admiração: “até flor, vocês cultivam aqui!” E o casal, tão singelo como a flor, me brinda esta lição: “A flor é para as borboletas. Elas põem os ovos aqui e não botam nas verduras. Assim, a gente evita as pragas. Nesses anos todos que nós mexe com horta, nunca deu lagarta na nossa couve nem nas outras verduras. Senhora pode ver. E a gente não usa agrotóxico.”
Imagine: horta sem praga e sem agrotóxico. E, ainda, com flores multicoloridas cultivadas sem mais trabalho. E bailado de borboletas.
Bem-me-quer, mal-me-quer… bem-me-quer, mal-me-quer… Meu espírito voa com as borboletas e retorna a antiga casa da Volta do Brejo. Bem-me-quer, mal-me-quer… bem-me-quer, mal-me-quer… Aos poucos, um novo cenário vai-se reconstruindo na memória. Cenas já quase apagadas se reconstituem: Bem-me-quer, mal-me-quer… bem-me-quer, mal-me-quer…
No quintal da minha infância, essa flor era nativa. Num solo úmido e fértil, não carecia de cuidados. Crescia e florescia no jardim entre dálias, jasmins, lampiões, manacás e sabugueiros; na horta e no pomar. E me encantava pela profusão de cores e pela alegria. Pelo suave perfume. Pela simplicidade. E pela magia.
Eu, menina, brincava de boneca e de casinha debaixo de uma velha mangueira, na divisa, onde moravam as fadas. Era neste lugar encantado que eu passava as tardes e fazia a lição de casa, estudando em voz alta para gravar no coração:
Eu amo, tu amas, ele ama,
nós amamos, vós amais, eles amam.
Minha casinha: sala, quarto, cozinha e biblioteca; tinha também um jardim. E meu jardim eram as trepadeiras que cresciam na cerca dividindo os quintais; as margaridas brancas e amarelas e as margaridas cor-de-rosa, vermelhas e alaranjadas, a que chamávamos de bem-me-quer. Um jardim que se estendia até o fundo do quintal, até a mina d’água no meio do arrozal, onde brincavam preás; até o Corguinho de água cristalina onde nadavam piabas prateadas, e eu pescava sonho e poesia; até o poço sem fundo que ia dar no Japão, do outro lado do Mundo.
Bem me quer, mal-me-quer… bem-me-quer, mal-me-quer… Ficando mocinha, essa flor da inocência e da pureza, agora me seduz pelos seus poderes mágicos. E, tirando pétala por pétala, ia repetindo alternadamente as palavras: bem me quer, mal-me-quer… bem-me-quer, mal-me-quer… para saber os sentimentos do menino que acendia a luz nos meus olhos e tocava o sino do meu coração.
Bem-me-quer, mal-me-quer… bem-me-quer, mal-me-quer…
A flor. Trata-se de uma espécie de margarida, cientificamente conhecida por Chrysantemum leucanthemum. O povo a conhece também como bem-me-quer, mal-me-quer, crisântemo pequeno, olho-do-dia.
Essa flor é símbolo da unidade. Em sua estrutura, o seu disco central, solar e luminoso e suas múltiplas pétalas, todas dirigidas para o centro, representa a unidade do corpo e espírito, a relação entre o terreno e o divino.
A margarida era utilizada por muitos povos antigos na medicina e como cosméticos, sempre associada à magia, mistério, palavras mágicas. Combate a tristeza e estabiliza as emoções; mantém a alegria e a jovialidade.
Popularizou-se pela brincadeira tradicional utilizada pelas moças para descobrir o real sentimento do namorado. Por isso, o seu significado está intimamente relacionado à pureza de sentimentos, inocência, virgindade, primeiro amor, e aos sonhos de menina.
Ainda hoje, a flor guarda certa magia. E seduz as pré-adolescentes em “Jogos de Menina” na internet, inspirado na brincadeira tradicional: Bem-me-quer, mal-me-quer.