Minha vida é um rio
E por mais piegas que a idéia possa parecer a vós
Doutos senhores donos da verdade
Isso não retira dela o caudaloso movimento de revolta
A amargura estática de contemplar o mundo
Sabendo que jamais retornarei àquele ponto
Sabendo que o rio jamais retorna
Ainda que eu suplique, clame, reclame
Jamais tornarei a ver
A curva de anteontem
Jamais tornarei a sentir
O ar da montanha ao sol da manhã
Caminharei eterno pro mar
Me juntarei a milhares que me precederam
Seguirei sorumbático, semimorto
Mas seguirei, pois minha vida é um rio
E o rio não se arrepende
Não sente saudades
O rio só vê à sua frente
Sente saudades do mar, do que há por vir
Sigo assim piegas, medonho, sorumbático, caudaloso
Sigo porque nada mais me resta
Sigo porque assim seria mesmo que não me apetecesse
Sigo, pois o mundo deve girar
Sigo, pois meu filho deve nascer
Sigo, pois quero ser eu
Ainda que não saiba o que isso quer dizer
Sigo apenas pelo prazer de olhar pra trás
E ver a curva que acabei de fazer.