Mao Tsé-tung – Citações – Sobre a Prática – Parte 1 – Do Conhecimento Sensorial ao Racional
A atividade dos homens na produção constitui justamente a base da sua atividade prática, o determinante de todas as demais atividades. O conhecimento do homem depende essencialmente da sua atividade na produção material, durante a qual vai compreendendo progressivamente os fenômenos da Natureza, as suas propriedades, as suas leis, bem como as relações entre ele próprio e a Natureza; ao mesmo tempo, pela sua atividade de produção, aprende a conhecer paulatina e gradualmente certas relações existentes entre os próprios homens. Não é possível adquirir qualquer destes conhecimentos fora da atividade na produção.
A prática social dos homens não se reduz à sua atividade na produção. Ela apresenta-se sob muitas outras formas: a participação nas lutas pelos direitos sociais e comunitários, a vida política, as atividades científicas e artísticas; em resumo, o homem, como ser social, participa em todos os domínios da vida prática da sociedade. É por essa razão que o homem, ao aprender, apreende em graus diversos as diferentes relações entre os homens, não apenas na vida material, mas também na vida política e cultural, ambas estreitamente ligadas à vida material.
A verdade de um conhecimento ou de uma teoria não se determina por uma apreciação subjetiva, mas pelos resultados objetivos da prática social. O critério da verdade não pode ser outro senão a prática social.
No processo da prática, os homens não vêem, ao começo, senão as aparências, os aspectos isolados e as ligações externas das coisas. Esta etapa do conhecimento denomina-se etapa sensorial, isto é, a etapa das sensações e das impressões. Esta é a primeira etapa do conhecimento. Nesta etapa, os homens não podem ainda formar conceitos, pois estes correspondem a um nível mais profundo, nem tirar quaisquer conclusões lógicas.
A continuação da prática social implica a repetição múltipla de fatos que suscitam nos homens a concomitante repetição de sensações e impressões. É então que se produz uma mudança súbita, um salto, na consciência desses homens e no seu processo do conhecimento: surgem os conceitos. Os conceitos já não são mais simples reflexos das aparências das coisas, dos seus aspectos isolados e das suas ligações externas, porque captam os fatos na sua essência, no seu conjunto e nas suas ligações internas. Entre o conceito e a sensação existe uma diferença não apenas quantitativa, mas também qualitativa. O desenvolvimento posterior, através do juízo e da dedução, pode levar a extrair conclusões lógicas. Esta é a segunda etapa do conhecimento.
A verdadeira tarefa do conhecimento consiste em passar das sensações ao pensamento, em chegar progressivamente à compreensão das contradições internas dos fatos, das suas leis e das ligações internas entre processos, quer dizer, em atingir o conhecimento lógico. Repetimos: o conhecimento lógico difere do conhecimento sensorial na medida em que este atinge apenas os aspectos isolados, as aparências e as ligações externas das coisas, enquanto aquele, dando um enorme passo à frente, alcança a totalidade de cada fenômeno, a sua essência e a ligação interna das coisas, pondo a nu as contradições internas do mundo objetivo e pode, por isso mesmo, alcançar o domínio do desenvolvimento do mundo circundante no seu conjunto, nas ligações internas de todos os seus aspectos.
O primeiro passo no processo do conhecimento é o contato com os fenômenos do mundo exterior: a etapa das sensações. O segundo é a síntese dos dados fornecidos pelas sensações, ordenando-os e elaborando-os: a etapa dos conceitos, dos juízos e das deduções. Só quando os dados recebidos pelas sensações são muitos, ricos, não fragmentários, completos, e estão de acordo com a realidade, que não resultem de um erro dos sentidos, podem servir de base para formar conceitos corretos e uma teoria correta.
O conhecimento racional merece crédito precisamente porque tem origem no sensorial; de outro modo, o conhecimento racional seria um rio sem nascente, uma árvore sem raízes, qualquer coisa exclusivamente subjetiva, autogerada e indigna de confiança. Na ordem do processo do conhecimento, a experiência sensorial vem em primeiro lugar; se vincamos a importância da prática social no processo do conhecimento é porque só ela pode dar origem ao conhecimento humano permitindo aos homens começarem a adquirir experiência sensorial do mundo exterior objetivo. Para uma pessoa que fecha os olhos e tapa os ouvidos e se isola totalmente do mundo exterior objetivo, não há conhecimento possível. O conhecimento inicia-se com a experiência: essa é nossa visão da teoria do conhecimento.
Comentários
É também base para essa discussão do filóso alemão Immanuel Kant que traz o “idealismo transcendental” o livro: Crítica da Razão Pura (1781).
“Age somente em concordância com aquela máxima através da qual tu possas ao mesmo tempo querer que ela venha a se tornar uma lei universal”.
Caro editor,
Para continuar esta reflexão sugiro “Dialética do Concreto” de Karel Kosik. Mas penso que este debate que interroga a relação entre a prática e teoria e de onde provêm as idéias, hoje precisa ser revisto contando com novas contribuições da epistemologia contemporânea. A complexidade e as incertezas nos apontam a necessidade de rever velhos paradigmas: antropocentrismo, o método científico e a separação e fragmentação do conhecimento. Outro “ponto de partida” para continuação desta conversa é o “Ponto de Mutação” de Fritjof Kapra.
Mas o tema é instigante e controverso. A Fundação poderia promover um mini-curso presencial sobre o assunto.
Abs, Sânia