– I –
A molecada malhou a valer o Judas
Pedradas, pauladas, baldes d’água
Sem piedade
Surrupiaram as três moedas
Que ainda trazia no bolso
E, ao final, o abandonaram…
Foi quando ele desceu do poste
Esmolambado, o corpo dilacerado
Sujo, enegrecido de fuligem
Seguiu cambaleante pela rua
Como se tomado de embriaguez
Foi indo aos tropeções
Rumo ao escuro vale
Tendo a acompanhá-lo
Magriço vira-latas
A esta hora o céu poente
Em rajas de sangue
Servia como sudário ao Nazareno
Que ao alto pendia da cruz
– II –
Não seremos nós a agredi-lo
Não o dependuraremos em um poste
para o estraçalhar impiedosamente
Um haveria que exercer o papel
não fosse este, outro seria
que não você, desventurado Judas
É o incontornável destino
que o obriga ao mesquinho, o faz interesseiro
capaz de um beijo a troco de moedas
que lançará a humanidade
num abismo sem fim de culpas
Mas Ele, o Senhor de tudo
de todos
já havia desde os primórdios decidido
a quem caberia o medonho papel
Restou para você, homem comum
ser o escorraçado, o traidor maior
que até o findar dos séculos será execrado
mesmo que não tenha tido qualquer chance
para da nefanda missão escapar
Consciente desse jugo
ao vermos o povo rua abaixo
em anarquia indo para o trucidar
permaneceremos aqui, circunspectos
certos de que talvez como àquele, o Tadeus
lhe coubesse também o epíteto de Santo