Chapadão do Burro Morto – parte I

Publicado por ELIS CALDEIRA 22 de outubro de 2022
Cruz do Burro Morto
Cruz do Burro Morto

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O Chapadão do Bugre foi imortalizado na obra literária do imortal Mário Palmério, virou minissérie na TV. Era uma terra de coronéis e disputas ferrenhas pelo poder. Mas hoje nós vamos tratar de outro Chapadão, bem mais tímido e discreto, chamado Burro Morto.

Segundo o geólogo e mineralogista alemão Barão de Eschwege (1777-1885), contratado pela coroa portuguesa para estudar o potencial minerário do Brasil, a Serra do Espinhaço, que ele assim denominou, era a única cordilheira do território brasileiro, não pela altitude de seus picos, mas pela extensão de sua cadeia de montanhas, mais de 1200 quilômetros.

Geologicamente surgiu no período pré-cambriano, entre 4,6 bilhões e 600 milhões de anos atrás, formada por chapadas de altitudes superiores a 1000 metros, que também podem ser chamadas mesetas, platôs ou planuras, se estendendo por grandes áreas, terminando em encostas abruptas ou tombadouros.

Pois bem, a história da Chapada é antiga, a do burro é mais recente, simples assim, o burro morreu e ficou ali, puseram a cruz, veio o IBGE, nas décadas de 1930 e 1940, fez o mapa e batizou essa extensa Chapada, Burro Morto foi chamada.

Carta IBGE Chapadão do Burro Morto
Carta IBGE Chapadão do Burro Morto
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Itacambira também teve seus coronéis, mas é história passada, hoje é uma cidade acolhedora encrustada numa das vertentes da Serra do Espinhaço Meridional, o Setentrional fica na Bahia. Abriga as nascentes dos dois principais afluentes da margem esquerda do Rio Jequitinhonha, os rios Itacambiraçu e Macaúbas. Além das águas tidas como medicinais, de sua brisa suave e úmida, tem um povo acolhedor que considera todo forasteiro gente boa, a menos que consiga provar o contrário. O único risco que o turista corre na cidade é o de ser atropelado por grandes procissões puxadas pelos mastros e andores dos santos de devoção. Nessas épocas os crentes se refugiam nas cachoeiras e ribeirões que a natureza dispôs ali em volta.

Mas é hora de falar da nossa chapada e do nosso burro. Ninguém nunca soube dizer quem foi que morreu ali, Manuelino Reis, Deolindo Cardoso, Nêgo de Branca ou Nem de Silvinha, não deixou apontamento, só que foi levado a sepultura cristã, mais provável na Macaúba. A carcaça do burro resistiu às intempéries, vento de levar o chapéu, frio de doer os ossos, nos mais de mil e trezentos metros de altitude daquele ponto da trilha onde o raio desencantou os dois. Resistência é que faz o burro merecer reverência, e a nossa aqui vai modestamente.

Corisco prefere lugar alto e pedregoso, e foi bem ali que a cruz apareceu de um dia pro outro, sem muita pá de explicação. Virou lugar não de romaria, mas um altar sagrado onde os cavaleiros ou muladeiros param, seguram o chapéu diante do coração e agradecem ao Criador poder contemplar aquelas serras que se afastam trocando o verde pelo azul e a neblina branca se mistura com o prateado das nuvens … O horizonte largo convida à oração.

Sabe-se também que aquele era o único acesso das Macaúbas pro comércio. Assim era chamada a cidade, o lugarejo, o aglomerado de casas embrenhado na serra, abaixo da chapada, Itacambira era o nome, nunca mudou, nem de nome nem de lugar, mas teve o Santo Antônio, dos apaixonados, que mudou de lugar. Nunca quis morar no descampado e plano que ajeitaram pra ele, lá pelas bandas da Vargem Grande, lugar amaldiçoado, disseram por conta disso, já que o santo cismou de amanhecer de volta lá na Igreja do Comércio. Desistiram da queda de braço com o santo que lá ficou.

(continua na parte II)

Comentários
  • Marlia Bicalho 762 dias atrás

    Adoro essas histórias. Sabia do Chapadão do Bugre, do Burro Morto, foi a 1a vez que vi.

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