nem para onde ia
Era um senhor quase mudo
era um senhor quase triste
– Venha, senta à mesa
Minha mãe ia às panelas
um bom prato lhe provia
uma pedra de cristal
noutra um cachorrinho
a que dei nome de Capucho
sentava-se sem palavras
comia pausadamente
a cabeça grisalha inclinada
vindo dos confins do sertão
inundando a nossa casa
com cheiro fresco de mato
chegava molhado de chuva
rosto e chapéu encharcados
botas cheias de lama
Mulher? Filhos? Trabalho?
Paixão não correspondida?
Palavra nenhuma dizia
a fumar cigarros de palha
era um homem quase mudo
mirando além dos pastos
perguntas em nossa casa
– De onde viera?
para onde haveria de ir?
certamente voltaria
minha mãe sempre dizendo
– Chega a qualquer dia…
ele não mais retornou
restando a lembrança do homem
que sequer um nome tinha
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Não há nomes na memória quando as coisas findam. Os retratos nos dizem uma história que só o tempo a nos levar pode tudo em nós apagar.