Fui recebido realmente num cenário de magia. Todas aquelas velas negras, aquela mulher linda, e ao fundo tocando um bom rock´n roll, o velho Rolling Stones, Sympathy for the Devil. Confesso que por alguns segundos passou pela minha cabeça, que sintonia entre cenário e música! Estaria eu ali entrando para conhecer o mundo do diabo? Não tinha medo e me joguei naquele universo. Daniela me recebeu aos beijos, e já me deu um gole de vinho. O vinho da liberdade. Eu estava extasiado pelo encontro, pelas circunstâncias, me permitira entrar naquela aventura real e conseguira chegar até lá. Não avisei ninguém, disse que havia chegado, mas não aonde nem com quem. Não devia satisfações, estava ali, pleno, pronto para o que ocorresse, pronto para satisfazer minhas fantasias mais recônditas.
Logo de início ela já foi direto ao assunto, já tratou de ir tirando minhas roupas e disse que aguardava há muito tempo por aquele instante. De cara já fomos para o sexo, um sexo animalesco, profundo. Ela realmente estava pronta para satisfazer todo meu apetite, e ele estava nas alturas. Foi belo, profundo e animalesco ao mesmo tempo. Depois permanecemos nus, fumei um cigarro e bebi o vinho. Ela me contou que chegou cedo, já havia rodado um pouco pela cidade, conhecido alguns hippies. Resolvemos sair para dar umas voltas com a garrafa de vinho e conversar, afinal depois de anos conversando no mundo virtual, finalmente nos encontramos. Ela parecia feliz de eu ter chegado.
Fomos andar pela cidade, na madrugada. São Thomé é uma cidadezinha linda e mística. Por ali circulam energias diferentes. A cidade estava calma, sem muita gente nas ruas, nenhum bar aberto. Nos sentamos na praça, e conversamos. À medida que a conversa fluía, ao contrário do que eu pensava, o mistério daquela mulher só aumentava, me cativava. Ela me contou dos tempos que viveu na África, da experiência de ver as condições inumanas da gente, do povo. Me contou sua vida, detalhes de uma história que compunham uma aura mais profunda. Seus ideais de liberdade acima de tudo. Ela fixava o olhar em meus olhos, dizia ali haver um brilho, uma ternura, algo diferente. Ela disse que precisava de mim, daquela energia pura que ela vislumbrava. Algo que eu nunca vi em mim. Mas sentia uma conexão muito intensa, alma, corpo e coração.
Ela me contou que andou olhando outras pousadas e descobriu que no dia seguinte teria um ritual com aiauasca, se eu quisesse participar. Ela já havia bebido o chá quando criança, pois foi criada por uma índia. Sabia do poder que ele tinha, me contava com entusiasmo como poderia ser libertador. Não seria por acaso que eu fui até ali e que ela descobriu essa oportunidade, eu pensei. Era chegada a hora de experimentar a aiauasca, de vivenciar tudo aquilo que se falava daquela bebida mágica, ancestral. Ela disse que a decisão era minha, que ela não iria decidir por mim. Eu disse que queria, que podíamos descobrir como participar.
No dia seguinte, pela manhã ela já me disse para começar a encarar meus medos. Minha mãe, vinha ligando, estava tentando contato e eu esquivava. Do que tinha medo? Porque não enfrentar aquele poder controlador que minha mãe tentava exercer sobre mim? Resolvi encarar aquilo e atendi uma ligação de minha mãe. Disse a ela onde estava, não importava com quem, mas não estava sozinho, e que voltaria em breve. Só queria ser deixado em paz para curtir o fim de semana. Deu certo. Ela respeitou e eu consegui menos chateação. Na verdade é que o medo está todo em nossa mente, o que ocorre externamente é apenas fruto das projeções de nossos próprios medos. Mal sabia eu os medos que ainda teria que enfrentar nessa louca jornada.
Depois da minha ligação ela conversou aparentemente com a mãe dela e fomos tomar café-da-manhã. Daniela me falava como meus olhos eram mágicos e haviam tido um efeito inebriante nela que nem as garrafas de vinho que tomou antes de eu chegar tiveram. Conseguiu adormecer um pouco essa noite, logo ela, sempre insone. Os papéis tinham se invertido, ela adormeceu, eu fiquei acordado. Não me preocupava, nunca cheguei a pensar naquelas velas negras da recepção ou na música. Se fosse mais viajado, talvez pudesse dizer que conheci e amei Lúcifer, o anjo decaído da Luz, mas as experiências daquela noite foram demasiado humanas para serem inseridas num contexto místico. O que ou quem era aquela bela cigana que estava na minha frente, com sua pele alva, seu sorriso marcante e seus mistérios, não me importava mais do que os efeitos do cigarro de palha que eu fumava no quarto. Igual a zero preocupação, sensação de liberdade absoluta. Não me importava o que ou como fazer quando voltasse. Precisaria mesmo voltar? Não poderia se abrir um novo universo de possibilidades ali mesmo? Talvez se abrisse, mas estava eu pronto para aceitar e enxergar essas possibilidades e me entregar totalmente ao fluxo de uma nova vida?
Isso tudo eu não pensava na época, aproveitava cada minuto com Daniela, observava como além da pouca necessidade de sono, também ela quase não comia. Eu parecia estar adquirindo essas habilidades, o que achei muito curioso. Ela pegava um pouco da minha calma, eu um pouco do seu desejo, íamos trocando energias, pelos olhares e beijos.
Fomos depois na pousada saber do ritual com a bebida sagrada. Na pousada Nhá Chica, conversamos com a Karol, que nos explicou que seria uma pajelança com os índios Katukinas do Acre, com a presença do pajé, do cacique e de uma índia responsável pelo canto. Ela explicou um pouco sobre a bebida, algumas orientações. Daniela me chamou, você decide, a decisão é sua, não quero influenciar. Eu falei que iríamos sim, e que fazia questão de pagar a dela, pois ela pagou a diária da pousada na noite anterior. Karol nos explicou como chegar ao local da cerimônia e o horário para estarmos lá.
Pegamos nossas coisas na pousada Arco Íris, e nos mudamos para a outra pousada. Em todas as pausas que tínhamos fazíamos sexo de todas as formas possíveis. Fomos nesse dia também à cachoeira da Eubiose, onde nadamos nus, e livres, somente nós aproveitando. Estava um dia delicioso, e as aventuras da noite já estavam para chegar.