Óleo sobre tela, Marina Jardim
Muitas brincadeiras estão entrando em extinção. O brinquedo industrial especialmente de controle remoto está tomando conta do espaço na vida lúdica das crianças. O exercício físico e mental fica postergado e quando muito é exercido nas operações digitalizadas que exigem atenção e memória apenas.
Brincar é um momento sagrado na vida das crianças. É através das brincadeiras que as crianças ampliam os conhecimentos sobre si, sobre o ambiente em que vivem, sobre o mundo lá fora e sobre tudo que está a seu redor. Brincar é fundamental. Elas manipulam e exploram os objetos, comunicam-se com outras crianças e adultos, desenvolvem suas múltiplas linguagens, organizam seus pensamentos, descobrem regras, tomam decisões, compreendem limites e desenvolvem a socialização e a integração com o grupo. E todo esse aprendizado prepara as crianças para o futuro, onde terão de enfrentar desafios semelhantes às brincadeiras.
O adulto, ao se permitir brincar com as crianças, sem envergonhar-se disto, poderá ampliar, estruturar, modificar e incrementar as experiências das crianças. Ao participar junto com as crianças das brincadeiras, ambos aprendem através da interação, constroem significados apropriando-se dos diversos bens culturais.
Na escola, esse resgate pode ser feito de duas formas: nas aulas de educação física e em gincanas recreativas, que deveriam ser muito mais frequentes nas escolas de hoje.
As igrejas podem contribuir também para que os filhos de sua congregação tenham uma infância mais feliz, propiciando momentos e espaço para brincadeiras e recreação.
Brincar exige a liberdade lúdica e espaços apropriados para se expressarem atitudes, palavras, gestos e atuações.
Nos tempos de 1950 a 1960, no interior, criança brincava com quase tudo.
As brincadeiras iniciais eram feitas com os pais para as crianças bem pequenas.
Alguns pais balançavam a criança nas noites de lua e cantarolavam: “Lua, luar, toma essa criança pra você criar. Depois de criada você torna a me dar. “
Ainda no berço era possível colocar o famoso xique-xique ou chocalho que a criança começa a manusear, ou uma bola de tamanho médio que a criança tocava com os pezinhos. Uma bola ou um bichinho de plástico com válvula para fazer barulhos sempre agrada os pequeninos.
Os adultos sempre encontravam uma maneira de brincar com as crianças desde pequeninas. Um versinho, palavras, mímicas e ruídos tudo serve de brinquedo nos primeiros meses de vida.
Dentre outras brincadeiras, a do Dedo Mindinho: (tocando cada dedo da mão) Mindinho, Seu vizinho, Maior de todos, Fura-bolo, Mata-piolho.
Ou, tocando a palma da mão da criança, pergunta: “Cadê o toucinho que estava aqui? A criança responde: O gato comeu! Cadê o gato? Foi pro mato. Cadê o mato?O fogo queimou. Cadê o fogo? A água apagou. Cadê a água? O boi bebeu. Cadê o boi? Foi carrear trigo.Cadê o trigo?A galinha comeu.Cadê a galinha? Foi botar ovo. Cadê o ovo? O frade bebeu. Cadê o frade? Foi rezar missa. Cadê a missa? O povo ouviu. Cadê o povo? Foi por aqui, por aqui, por aqui…” Imitando um ratinho, o adulto caminhava com dos dedinhos pelo braço da criança até as axilas, fazendo cosquinhas)
Com crianças logo que ficavam em pé os pais faziam a peneirinha de peneirar fubá que era segurar com as suas, as duas mãozinhas da criança e falar: “Peneirinha de peneirar fubá, um dois e já.” E fazia uma pirueta com a criança. Uma variação era o barquinho que virava no fundo do mar, que terminava com o mesmo giro ou pirueta do corpinho da criança.
Na diversão, para os maiorzinhos, os pais e mães, às vezes davam uma mãozinha na confecção dos objetos usados pelas crianças.
Era o caso de confeccionar bonecas de panos feitas pelas mães para as meninas e os carrinhos de carretel feito pelos pais. Uma pequena tábua com o recorte de um automóvel tradicional e dois cortes para encaixar os carreteis permitiam ao garoto correr de joelhos a manhã ou a tarde toda com o brinquedo, direcionando o carretel da frente, que virava o veículo, com os dedos . E o ronco dos motores era feito com a boca e até buzina eles reproduziam com esmero: BI-BIP!!. O carrinho de carretel poderia ter ainda a forma de caminhões, caminhonetes e ônibus.
No caso das bonecas, até bem poucos anos era comum o batizado das bonecas que, geralmente, rendia uma animada festinha com docinhos e sucos feitos pelas mães, mais modernamente, refrigerantes comprados, com direito até à representação do padre, que alguns faziam com grande talento.
Para escolher ou “tirar” os participantes, ou seja, para escolher a vez para uma brincadeira era comum a parlenda Uni-Duni-Tê Segundo o dicionário, parlendas são rimas infantis, em versos de cinco ou seis sílabas, para divertir, ajudar a memorizar ou escolher quem fará tal ou qual brinquedo Uma das parlendas de escolha que as crianças do Brasil mais gostam é o UNI-DUNI-TÊ: Uni, duni, tê, Salamê, mingüê, Um sorvete colorê, o escolhido foi VO-CÊ! À medida que falam tocam nos participantes até que chegue no escolhido. E assim sucessivamente até escolher todos os participantes da brincadeira.
Muitas lembranças boas vêm dos montes de areia das casas em construção na vizinhança. A areia lavada, sempre úmida, com todo o seu potencial plástico permitia as esculturas mais criativas, os buracos, túneis, pontes, os tradicionais castelos e até as sereias. O perigo eram as “guerras na areia” que podiam acabar com alguém chorando com areia nos olhos, o que exigia a pronta intervenção dos pais.
Comentários
Muito obrigado, Milton. Parabéns por publicar antes do dia das crianças.